Emanuel Pires Galvão
CONTE-NOS SUA HISTÓRIA
direitoamemoriaa@gmail.com
Fonte: Laíde Barros Medeiros
Entrevista: Keila Serruya Sankofa
Texto: Kennedy Costa
Uma carta do Emmanuel Pires.
Querido Emmanuel,
A luta antirracista sempre foi uma questão central na vida da população preta, e parte dessa contribuição vieram de homens pretos, que com suas historias, costumes e vivencias doaram do tempo e protagonismo político cultural e social para transformar as cidades.
Emmanuel, lhe escrevo com muita emoção em revirar os arquivos que foram recolhidos através de telefonemas, entrevistas e gravações para compreender sua luta nesse território amazônico. Sua atuação militante foi de muitas guerras vitoriosas, não é fácil lutar contra o racismo em uma espaço de apagamento, como este. Aproveito para clicar nas redes, buscando mais sobre você e suas movimentações.
Sua vivência dentro do terreiro com sua Mãe Eunice, trouxe consciência sobre sua existência, e re-existência preta. Percebo que essas simbologias, mesmo você sendo um homem ateu, foram culturalmente essenciais para lhe tornar o homem que foi.
Posso sentir aqui, quando você estava no terreiro de sua avô, quando brincava com seus primos das ruas da Praça 14 ou nas discussões do partido comunista do Brasil, sua presença marcante como homem negro, dos encontros espirituais, cada uma, como forma simbólica que jamais poderiam ficar no esquecimento e no atravessamento do isolamento racial, é preciso reconhecer o direito à memória e olhando cada detalhe de sua experiência, escrevo para recordar, reviver e reescrever sua história de vida e nascimento, nos marcos do mito da democracia racial pelos militares desde 64, sua dedicação na luta anti racista, organização partidária e disputas eleitorais.
A história se mostra na construção do nosso presente Negão, o dia onze de março de cinquenta e nove você chega ao mundo, sua mãe Dona Eunice Pires e seu pai Fernando José, cruzaram a genetica da negritude com a biologia da resistência.
A Fundação da Escola de Samba Mista, do Bairro da Praça 14 celebra o patrimônio artístico cultural fruto da luta geracional de sua família, marcam as rodas de samba no pátio da casa da Tia Lindoca, o samba também lhe formou.
O carnaval que boa parte da vida fez seus dias alegres, é esse símbolo poderoso da resistência do povo negro, as feijoadas e a consolidação dos direitos dos quilombos pela terra e pela vida marcou sua trajetoria.
Sua historia ao longo de minha pesquisa aos vinte e sete anos de vida, foi atravessada pelo reconhecimento de sua caminhada, e pela sua vivência, soube através de sua companheira relatos de enfrentamento ao racismo no dia a dia, “quando ia passar os finais de semanas na beira do rio, como um bom manauara, costumava sempre ser parado na barreira policial, questionando seu trajeto e solicitando seus documentos. Sabemos exatamente qual o motivo dessa atenção, é a pele preta” contou Laíde em uma de nossas conversas ao telefone.
Perdemos sua matéria em 2015, logo depois da semana da consciência negra, mas além das lembranças, histórias contadas por seus companheiros e familiares, da UNEGRO, PCdoB, do Movimento ALMA NEGRA (MOAN) e em seguinte o AMONAM espaço onde era atuante. Há um legado da sua defesa aos direitos humanos, democracia, classe trabalhadora, sua luta incessante contra o racismo, sua trajetória torna o mundo mais harmônico e justo, Companheiro.
Em 2005 você se formou em Direito, como necessidade para compreender a justiça ou a falta dela em nosso país. É inspirador saber que essa luta é realizada em tantas camadas, você também colocou seu nome a disposição do Estado como candidato a deputado federal, uma oportunidade de ocupar espaços institucionais que pouco é ocupado por nosso povo preto, pelo valoroso Partido Comunista do Brasil, do qual já fui filiado por 6 anos ininterruptos, também dedicado às lutas anti racista, toda essa questão política era pensada a partir do Marxismo enquanto teoria e o Materialismo Histórico Dialético enquanto método, desde a formação até a atuação e intervenção, percebi durante minha busca que suas propostas sempre foram permeadas tendo a categoria classe social como central, e considero oportuno fazer essas observações para você, porque gênero e raça perpassam por classe.
É provável que essa carta não chegue até você, que ela se perca no caminho, mas confesso que o destinatário também são todos viventes desse território de apagamento. Compartilhar informações antirracistas, que salvam vidas e mudam gerações futuras, é dar continuidade ao trabalho realizado por você, Companheiro.
Um grande abraço meu nobre companheiro, Emmanuel Pires.