Lamartine Silva
CONTE-NOS SUA HISTÓRIA
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Biografia Lamartine Silva
Movimento Hip Hop
Entrevista Keila Serruya Sankofa
Texto Jéssica Dandara
“Já aconteceu casos, como por exemplo em um terminal de integração de ônibus, que me perguntaram se eu estava vendendo maconha, dizendo “Ah, porque o seu visual é de traficante”, porque eu tava com uma bolsa com as cores do reggae também. Aconteceu no Largo São Sebastião (Centro de Manaus).”
Lamartine Silva, ativista do movimento hip hop e do movimento negro no Brasil, percorreu muito chão de luta neste país. Vem de uma família matriarcal, filho de Maria José Silva e Gumercino da Conceição Silva, nasceu no ano de 1969, em Colina, São Cocais, no Maranhão, perto de São Luís, de Caxias, numa região chamada de Cocais porque tem muito coco babaçu.
Negro Lamar, como é popularmente conhecido, contribuiu para a solidificação do movimento hip hop no Brasil. Foi pioneiro na construção de muitos coletivos e vem de uma família também de protagonistas, de professoras negras, sendo sua avó, Marsilva, a primeira professora negra de Colinas. Marsilva foi autodidata, não tinha diploma, mas alfabetizou muitas autoridades da cidade, tem uma escola com seu nome e até um livro contando a sua história.
Hoje Lamartine cursa pedagogia na UFAM, tem formação em telecomunicação, numa escola técnica federal, e seu contato com o hip hop foi nesse lugar, por meio de um rapaz, em uma feira de arte nesta escola, onde conheceu uns rapazes que dançavam break, em 1986.
Através da dança, foi, inclusive, professor de funk durante três anos pelo estado do Maranhão. Nesse período, conheceu Reitut, no ano de 1988, que o convidou para fazer rap pela primeira vez, tornando-se, assim, o primeiro rapper da cidade, no qual inaugurou o primeiro grupo que organizava eventos da cultura hip hop, e formando uma entidade apenas em 1992, com a composição de pessoas negras, chamada “Quilombo Urbano”.
Além de bailes de rap, o grupo Quilombo Urbano fazia grupos de estudo para entender socialismo, cultura negra, etc. Com esse grupo organizado foi possível entrar em contato com pessoas de outros lugares, como Ceará, Paraíba e Pará para fazer festivais, sempre unindo arte, cultura e debate. Foi através destas conexões que Negro Lamar começou a viajar para outros estados.
Lamartine, em viagem à São Paulo, realizou atividades com Racionais MC’s, participou da primeira revista de rap do Brasil, chamada “Pode crer”, revista articulada por Sueli Carneiro, Solimar Carneiro, Deise Benedito, em projeto do Geledés - Instituto da Mulher Negra, onde faziam debates sobre cultura negra, hip hop.
Por meio desse encontros nasceu a iniciativa de montar a primeira organização nacional de hip hop, e, desta maneira, foram realizadas viagens pelo Brasil para criação desta organização. Foram duas tentativas, a primeira frustrada, mas na segunda surgiu o Movimento Nacional de Hip Hop Brasileiro, o MNHOB.
Foram muitas as articulações feitas neste período, dentre elas a criação do FavelAfro. Negro Lamar compôs tambem o grupo de rap chamado Clã Nordestino, tendo no seu primeiro álbum a participação de KLJay e MVBill, e chegou a se apresentar ate na Europa.
Sua trajetória na articulação do MNHOB rendeu um documentário sobre as viagens feitas para firmar um movimento nacional de hip hop, e participação em outro documentário sobre o trabalho desenvolvido para “pacificar” as gangues de grafite.
A caminhada de Lamartine no movimento hip hop se deu atrelada às questões raciais, e foi através do rap que se deu seu reconhecimento enquanto negro, pois ate 1992, Lamar relata que se identificava como uma pessoa morena. Foi através da música “Malcom X”, do grupo de rap “Voz ativa”, que Lamartine começou a refletir sobre a sua identidade racial. Após ouvir essa música procurou ter acesso ao livro sobre a biografia de Malcom X e conseguiu com o Centro de Cultura Negra, lugar que ele frequentava. A partir da leitura deste livro, começou a ler outros relacionados à raça, o que foi crucial para o seu engajamento no movimento negro.
Dentro desta trajetória no movimento negro foi eleito à conselheiro nacional de cultura, no qual foi possível em boa parte pela articulação de povos de terreiro, mães de santo do norte e nordeste, dentre elas Nonata Correa, sendo este seu primeiro contato com o movimento negro de Manaus. No ano de 2005 conheceu algumas pessoas do movimento hip hop do Amazonas, no encontro de hip hop do norte e nordeste, no Pará, e veio em Manaus a primeira vez, para o primeiro Festival de Hip Hop da cidade, em 2007.
Lamartine Silva contribuiu na construção de algumas casas de cultura no Brasil, como a Casa de Hip Hop do Nordeste, em Teresina, um grande ponto de cultura até hoje, e no Pará a Casa Preta. Por acreditar na força do movimento negro e hip hop, foi levado a diversas cidades, ocupando diversos espaços. Se tornou conselheiro nacional de juventude, representando o movimento hip hop, e conselheiro nacional de cultura, como representante do movimento negro, onde participou da elaboração do projeto do Plano Nacional de Cultura, do plano Juventude Viva, voltado à juventude negra.
Um cidadão do mundo, que luta pelos direitos civis do povo negro e de terreiro. Lamar escolheu o Amazonas para viver e para continuar lutando para melhoria de seu povo, acreditando fortemente na juventude.
Morador de Manaus a 8 anos, Lamartine comenta sobre seu olhar sobre o racismo na cidade:
“Já aconteceu casos, como por exemplo em um terminal de integração de ônibus, que me perguntaram se eu estava vendendo maconha, dizendo “Ah, porque o seu visual é de traficante”, porque eu tava com uma bolsa com as cores do reggae também. Aconteceu no Largo São Sebastião (Centro de Manaus).”